domingo, 30 de janeiro de 2011

Mas afinal, o que é que você faz?

Iow

Final de férias na cidade natal, almoço em família, pai, avô, avó, tio, sobrinho, cachorro etc. reunidos, velharada falando de doença e morte, tios perguntando "e aí, quando é que vai casar?"... Tudo na paz.

Após os comes e bebes, quando boa parte dos parentes já se foi (aquela parte que só vai pra comer, ou seja, 90% dos parentes no caso da minha família), sentou meu avô ao meu lado no sofá que fica na varanda, olhou para o horizonte, e mesmo depois de eu estar mais de 7 anos na mesma profissão, perguntou:

"Mas afinal, o que é que você faz?"

Dei uma leve risada e tentei imaginar alguma forma de explicar. Como dizer para o meu avô, que nunca segurou em um mouse, que eu "faço software"? Como fazer ele entender a difereça entre um digitador e um analista de sistemas? Como fazer ele entender que é possível ficar parado olhando pra um monitor e chamar isso de trabalho?

Meu avô, mesmo com seus 80-e-guaraná-com-rolha anos, se mantém ativo em seus ofícios. Ele tem um quartinho onde reúne sua bagunça: pedaços de metal, tampas de panela, madeira de vários tipos, ferramentas, material de solda... Ele vive consertando aquilo que ninguém acha que tem conserto: cabo da panela que soltou, ralador que quebrou, armação de alguma coisa que entortou, e assim por diante.

Isso quando ele não inventa alguma coisa. Não é raro eu chegar lá e ele me mostrar uma geringonça qualquer e me perguntar "Sabe pra que serve isso?"... Minha cara de ponto de interrogação sempre me entrega.

Além dos ofícios, meus avô é um expert em plantas medicinais. Qualquer mato que se vê por aí ele sabe o nome, pra que serve, e como fazer (chá, pomada, salada enfim). A única coisa que ele não sabe é como tornar o chá agradável de ser tomado... Cheguei a essa conclusão depois do chá de losna que tomei.

Pois então, todo essa sabedoria de repente olha pro horizonte e me pergunta o que eu faço da vida. O que responder?

Foi aí que me dei conta... Não faço nada de diferente dele. Do mesmo modo que chega pra ele uma panela toda destruída e ele tem que achar um jeito de arrumar, com as ferramentas que tem, chega pra mim um requisito de um cliente, e eu tenho que achar uma solução com as ferramentas que tenho. Da mesma maneira que ele se vê obrigado a criar algo novo para resolver um problema, eu tenho que inovar (jargão do momento) para ultrapassar os desafios. Da mesma maneira que ele fica horas olhando para um problema tentando achar uma solução, eu fico olhando para o monitor.

A diferença básica entre os nossos ofícios é que o que eu faço "não existe", ou seja, não é palpável, tangível. Requer conhecimentos de engenharia, arquitetura e design, mas engenharia, arquitetura e design de software. O resultado final é só uma receita de bolo, um algoritmo que uma máquina executa... e não um prédio construído, uma casa reformada ou uma panela arrumada.

"Fazemos a mesma coisa... Só que em épocas diferentes." concluí. Mesmo com seu jeito de italianão fechado, não conseguiu disfarçar um sorriso... Afinal, seu neto seguiu seus passos... só de uma maneira diferente.

Eu também não disfarcei o meu sorriso, afinal consegui fazer meu avô entender o que faço... Coisa difícil para quem é da área de T.I.

Será que meus netos também terão dificuldade de me explicar a profissão deles?

Té++